15 abril 2008

> Eu surtei"

"Eu surtei", diz Farah Jorge Farah; júri recomeça nesta quarta
Rosane D' Asgostino
O ex-cirurgião plástico Farah Jorge Farah disse nesta terça-feira (15/4), em interrogatório no Fórum de Santana, que era constantemente perseguido pela dona-de-casa Maria do Carmo Alves, esquartejada em nove pedaços sob efeito de anestesia em janeiro de 2003. “Eu surtei”, disse o ex-médico, cujo júri popular deve se estender até quinta-feira. O corpo da vítima só foi encontrado dias depois do crime, dividido em cinco sacos de lixo, no porta-malas do carro do médico.
O julgamento acontece no 2º Tribunal do Júri e foi suspenso às 22h05, depois do depoimento de dez testemunhas. O juiz Rogério de Toledo Pierri preside o júri. Celulares, gravadores e laptops foram proibidos na sessão. Aos 59 anos, Farah é réu em processo por homicídio duplamente qualificado, destruição, ocultação e vilipêndio a cadáver. Está em liberdade desde maio de 2007, após quatro anos preso, graças a habeas corpus do STF (Supremo Tribunal Federal) que considerou que sua prisão preventiva não se justificava apenas pela gravidade do crime e clamor público.

Com o benefício da liberdade, pôde inclusive assistir a um julgamento no mesmo Fórum de Santana às vésperas de seu próprio júri. Até agora, além do réu, dez das 23 testemunhas foram ouvidas. Um acordo entre o Ministério Público e a defesa dispensou a leitura dos autos. Em conseqüência disso, o tempo de exposição para cada uma das partes foi fixado em quatro horas, com mais uma hora para que acusação e defesa argumentem em suas réplicas e tréplicas. Ao final do primeiro dia de julgamento, a defesa de Farah disse que deve pedir a nulidade do júri, em razão de uma série de irregularidades processuais no andamento da sessão. Segundo Roberto Podval, os depoimentos foram tomados em ordem errônea em razão de uma série de complicações de saúde de testemunhas.
As oitivas foram iniciadas com a versão de peritos da defesa e duas mulheres que passaram mal antes do júri.InterrogatórioO julgamento, marcado para as 10h, começou com quase seis horas de atraso, às 15h40. Um erro do cartório — que deixou de emitir a intimação para que uma das testemunhas, de Santo André, comparecesse ao Fórum de Santana— por pouco não provocou novo adiamento do júri, contornado por um oficial de Justiça que localizou a pessoa a tempo. Farah Jorge Farah chegou ao prédio do 2° Tribunal do Júri pouco antes das 10h.

De bengalas, amparado pela defesa e assediado por jornalistas, o ex-cirurgião tropeçou, caiu e foi resgatado por quem o rodeava. No interrogatório, sustentou que era perseguido pela dona-de-casa na época do crime. Disse estar perdido, transtornado e deprimido por perder um grande amor por culpa da vítima. "Essa mulher vinha me perseguindo constantemente e à minha família.”Maria do Carmo chegou ao consultório no momento em que ele fechava a sala e apagava as luzes.

Ao ser questionado se cometeu o crime, Farah afirmou que “houve luta", mas não se lembrava de como ocorrera o esquartejamento na clínica. “Ela disse que queria ter uma conversa civilizada, e eu concordei, após cinco anos de perturbação. Quando vi, ela já estava no corredor com uma faca na mão. Eu já usava essa bengala [após cirurgia de retirada de câncer] e me defendi. Ela bateu a cabeça na parede, nós nos atracamos, ela xingou minha mãe e não me lembro de mais nada.”

Ainda de acordo com Farah, ele não conseguia distinguir realidade de sonho. “Me defendi tanto quanto pude. Só cai em mim no dia seguinte. Agi em legítima defesa”. O ex-cirurgião reafirmou que manteve relacionamento com a dona-de-casa, mas diz que terminou quando soube que ela era casada. Também admitiu manter envolvimento amoroso com outras pacientes, mas que nenhuma o perseguiu dessa maneira.“Ela começou a ameaçar a mim e a minha secretária dizendo que iria bater nela. Eram atitudes agressivas tão intensas que o medo em nós começou a aumentar”, disse. Com relação às perseguições, ele fez questão de citar que tentou o auxílio da Justiça e a proteção do Estado, mas o que ouviu foram respostas jocosas de que eram apenas brigas de casal.

Conforme Farah, “eram ligações incontáveis. Ela ficava o dia inteiro discando o redial para impedir que eu fizesse qualquer outro tipo de contato telefônico”.Farah citou que seus pais estavam doentes e morreram sem cuidados no período em que permaneceu na cadeia. “Não desejo isso para ninguém”, afirmou soluçando, de costas para o público, de terno azul e segurando a bengala. “Estou trêmulo, tenso e arrasado.”A defesa preparou uma lista com todas as ligações realizadas por Maria do Carmo Alves a fim de comprovar a perseguição.
.Testemunhas.
Após o interrogatório, foram ouvidas nesta terça nove das 23 testemunhas escaladas para o julgamento. Marina Borini, uma delas, defendeu Farah, com quem conviveu na época de estudante. “Eu o conheço desde 1972. É uma pessoa extremamente boa, prestativa, que não teria feito isso em hipótese nenhuma”, afirmou. Ao sair do plenário, ela o abraçou e beijou sua testa.

“Deus te abençoe e ilumine”, desejou. Os três médicos responsáveis pelo parecer que suspendeu o exercício de medicina de Farah reafirmaram que foram zelosos em pensar que ele pudesse cometer outro fato grave contra um paciente. Sobre a sua amnésia, disseram que não é impossível, mas pouco provável. No depoimento mais forte da noite, uma testemunha de nome Sandra relatou ter sofrido abusos do ex-cirurgião na mesma clínica em que Maria do Carmo foi esquartejada e morta.

“Sentia uma voz no ouvido, beijos no rosto, uma língua, um aroma de frutas, banana e laranja. Não voltei nem mesmo para tirar os pontos. Eu me culpava, sou casada”, afirmou, aos prantos. O advogado de defesa de Farah, Roberto Podval, tentou desqualificar o depoimento, ao citar que, depois do crime, a vítima entrou com ação de indenização, que foi negada pela Justiça. Disse ainda que o inquérito foi arquivado.

Próximos passosNa quarta-feira (16/4), após os depoimentos de todas as testemunhas, devem ocorrer a exibição de dois filmes, "Atração Fatal" e "Tomates Verdes Fritos". Os longas narram histórias sobre crimes cometidos em legítima defesa e obsessão. A defesa deve mais uma vez argumentar que Farah agiu sob perseguição insuportável da dona de casa.
Os debates devem ficar para o último dia de julgamento.Antes do início do julgamento, o promotor Alexandre Marcos Pereira disse que não será surpresa se o réu continuar solto mesmo se condenado pelo crime. O caso guarda paralelos com o do jornalista Antonio Marcos Pimenta Neves, condenado em 2006 a 19 anos de prisão por matar a ex-namorada Sandra Gomide, em agosto de 2000.

Pimenta pôde recorrer em liberdade por conta de um habeas corpus proferido pelo STF (Supremo Tribunal Federal), instância superior ao Tribunal de Justiça de São Paulo. Assim como Pimenta, Farah é amparado por liminar em habeas corpus do STF.
Terça-feira, 15 de abril de 2008

Um comentário:

  1. Ficar triste por causa de um doido? não vale a pena jota. Mas como sempre o texto está impecável. gosto de vir aqui. Um abraço

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